REVISTA GALILEU - DEZEMBRO DE 2008 - A NOVA ERA DO ESPIRITISMO




A nova era do Espiritismo

Novas influências estão reinventando a Doutrina no Brasil. Mas será que o fruto dessa metamorfose ainda pode carregar o nome da corrente criada por Allan Kardec há 150 anos?

Texto - Pablo Nogueira



O Espiritismo voltou às manchetes com força em 2008, graças ao sucesso do filme "Bezerra de Menezes - Diário de um Espírito". Por meio dele, quase 500 mil brasileiros relembraram (ou conheceram) a história do chamado "Kardec brasileiro", médium e maior nome da Doutrina no País no final do século 19. Esse instantâneo histórico, que narra a consolidação dos fundamentos do Espiritismo por aqui, serve de contraponto para uma tendência que gera polêmica : A mistura do Espiritismo com outras correntes filosóficas e a medicina holística, que trabalha corpo e mente simultaneamente.

Enquanto, segundo o IBGE, 2,4 milhões de brasileiros declaram-se Espíritas, outros cerca de 30 milhões - de acordo com estimativas da Federação Espírita Brasileira e de outras fontes como a Revista Veja e o Programa "Globo Repórter" - simpatizam com as ideias da Doutrina. E os últimos, cada vez mais, estão misturando correntes de pensamento orientais (como hinduísmo, ioga e tai-chi-chuan), terapias energéticas ou a força do pensamento positivo em seus rituais e práticas. A questão que fica é : O Espiritismo irá incorporar essas influências ou os tradicionalistas acabarão mantendo as coisas separadas?




O catarinense André Luiz Monezi Andrade, 24 anos, Psicólogo e e Mestrando em Neurociências pela Unifesp, vem de uma família Espírita e frequentou Centros regularmente até 2007. No início de 2008, mudou-se para São Paulo, a fim de cursar a pós-graduação. Na capital paulista, começou a frequentar grupos alternativos e deixou de ir às Sociedades Espíritas tradicionais. "Estudar os conceitos Hindus de carma [ que diz que os indivíduos carregam os erros e acertos de uma vida pregressa para a seguinte ] e darma [ que trata da missão individual e das ações virtuosas de cada um na terra ] esclarece mais coisas sobre a reencarnação, por exemplo. E o "Reiki" trata daquilo que os Espíritas chamam de passe. Acho que esses estudos proporcionam uma forma mais abrangente de se ver o Espiritismo", diz André Andrade.




"Não temos nada contra essas terapias, mas como o próprio Kardec diz, isso tem que ser feito fora da Casa Espírita", diz Wladisnei da Costa, membro do Conselho da União das Sociedades Espíritas de São Paulo. A Instituição reagiu à tendência de forma oficial, em junho de 2008, por meio de um comunicado aos seus associados, cujo nome foi "Orientação às Sociedades Espíritas". O Documento, que não tem valor impositivo, começa por dizer que "o trabalho de unificação do movimento Espírita (...) é fundamental para o crescimento das Instituições e para a correção de eventuais desvios da adequada prática doutrinária e administrativa."







Criada há 150 anos pelo professor francês Hippolyte Léon Denizard Rivail, ou Allan Kardec (1804-1869), a Doutrina Espírita surgiu graças à curiosidade e ao fascínio pela possibilidade de comunicação com os mortos. Quando chegou ao Brasil, anos depois, o Espiritismo encontrou terreno fértil. O sincretismo da mistura entre europeus e africanos acabou impulsionando o movimento.

Hoje, quem entra em uma Sociedade Espírita no Brasil encontra uma mistura de hospital Espiritual e Centro de Estudos. Ali, os tratamentos se resumem ao atendimento com passes (em que o médium repassa ao atendido a energia dos Espíritos e a sua), à ingestão de água fluidificada (na qual fluídos medicamentosos são adicionados por espíritos desencarnados), e às desobsessões (nas quais o médium incorpora Espíritos que interferem na vida de alguém).

Além disso, há centros onde outras manifestações, como a psicografia, são presenciadas. Quem quiser pode desenvolver sua própria mediunidade. Todos os atendimentos são de graça e tudo é embalado pela divulgação dos livros de Kardec e de autores como Chico Xavier, segundo recomendações da Federação Espírita Brasileira.



Para saber mais :

* Espiritismo à Brasileira, de Sandra Stoll, Edusp. 2003.

* O Grande Mediador, de Bernardo Lewgoy, Edusc. 2004.

Fonte : Revista Galileu - Lançamentos da Editora Globo





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